OPINIÃO

O caminho feito pelos direitos humanos

Celebrámos a 10 de dezembro os 75 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Apesar de vivermos um tempo ensombrado por guerras, apesar de testemunharmos um mar mediterrâneo aqui tão perto onde tantas pessoas perdem a vida, apesar das perseguições a defensores dos direitos humanos e apesar das promessas por cumprir dos líderes políticos no que diz respeito ao combate às alterações climáticas: o nosso olhar tem de ser o da esperança de mangas arregaçadas. O da esperança que vai continuar a agir.

O mundo em 1948 era sombrio, ainda que a declaração universal dos direitos humanos lhe prometesse luz.
A europa renascia da segunda guerra mundial e da sua destruição, via-se a braços com uma guerra fria a dar os seus sinais, com guerras ultramarinas de que era protagonista pela persistência do colonialismo. Com ditaduras como regime vigente em muitos países do mundo onde a norma era a repressão ao pensamento livre.
Também nós em Portugal vivíamos um país rural de emigração para fugir à fome e à pobreza. Do meu lado um avô que foi a salto para França. O outro que emigrou para Lisboa e depois para os Estados Unidos. E as avós, mulheres, nem à escola puderam ir.
Os tempos não eram fáceis.

Muito se caminhou e alcançou nestes anos, foram alcançadas conquistas de melhor vida e mais direitos humanos, desde os direitos civis e políticos, com a liberdade de expressão, à igualdade de género, aos direitos económicos e sociais, ao acesso à educação e até à saúde.
Os avanços são inegáveis! E é isto que temos de ter presente sempre que pensarmos em baixar os braços.

Este ano de 2023 marcou-me especialmente a história do músico angolano Tanaice Neutro. Artista, ativisita, casado, pai. Por ter falado e cantado a necessidade de ninguém passar fome em Angola foi preso em janeiro de 2022. A Amnistia Internacional foi incansável a reunir apoios, a sensibilizar as pessoas numa campanha que que fez em seu nome. Os esforços dos nossos apoiantes foram recompensados com a sua libertação em junho.

Do mesmo modo marcou-me o caminho que a Amnistia Internacional fez para internamente deixar a sua posição de neutralidade face aos conflitos bélicos apenas investigando e analisando as violações do direito humanitário internacional nas mesmas. Honrando o Nobel da Paz que recebemos em 1977, fomos dos primeiros a pedir um cessar-fogo em Israel e nos Territórios Palestinianos Ocupados.
Num conflito que tanta polarização provoca, senti-me muitas vezes uma voz radical a pedir paz. É estranho que já não seja normal apelar à paz, à segurança da ajuda humanitária, ao diálogo sobre as causas profundas dos conflitos para os resolver com justiça e reparação.
Por vezes senti-me, em nome da Amnistia Internacional, como um profeta a falar no deserto, mas o que é certo é que se conseguiu um cessar-fogo de alguns dias que salvou reféns israelitas, que permitiu ajuda humanitária na faixa de gaza, que salvou vidas.

O trabalho resulta. Que seja esta a certeza que levamos para 2024. Continua a haver muito por fazer. Continuemos por isso, com uma esperança persistente de ação, de mangas arregaçadas.
Pedro Neto

Diretor Executivo da Amnistia Internacional em Portugal

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