OPINIÃO

Conciliação entre o trabalho e a família – uma necessidade ao longo da vida

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A partir da década de 70, as mulheres entraram em força no mercado de trabalho em Portugal, que é, atualmente, um dos países europeus com mais elevada taxa de participação feminina no mercado de trabalho, representando as mulheres, metade da sua força de trabalho.
De acordo com os dados mais recentes fornecidos pelo Eurostat, em 2023, Portugal apresentava uma taxa de participação das mulheres no mercado de trabalho de 75,5%, acima da média da UE 27, que foi de 70,2%.
No entanto, a dificuldade na conciliação entre a vida profissional, pessoal e familiar continua a ser particularmente penalizadora para as mulheres, continuando a ser elas quem, para além do trabalho decorrente do seu emprego, ainda se vêm a braços com a 2ª jornada de trabalho, que não é remunerado, e nem sempre reconhecido. Tratar da casa, da família, das compras, das refeições, das roupas, e ainda acompanhar as filhas ou filhos nos trabalhos escolares em casa ou nas das ao médico. Elas, quase sempre elas e, muitas vezes, SÓ ELAS.
Ora, esta realidade tem um forte impacto na vida das mulheres, cujo bem-estar tem sido duramente afetado, levando ao cansaço extremo, com enorme dano para a sua saúde e com custos elevados para o país.
Além disso, a discriminação em contexto laboral persiste, e as mulheres continuam a ser discriminadas, não só por serem mulheres, mas sobretudo por serem mães, penalizadas pelo preconceito de terem menor disponibilidade para o trabalho, porque têm de cuidar da casa e dos filhos.
Ou seja, se não existirem mecanismos eficazes que promovam a conciliação entre a vida profissional e a vida familiar das pessoas trabalhadoras, por um lado, e que promovam a partilha das tarefas domésticas e de cuidado, por outro, rompendo com o preconceito de que cabe apenas às mulheres a responsabilidade exclusiva de tratar da casa e da família, as mulheres continuarão a ser mais penalizadas, sobretudo se tiverem família a cargo, sejam crianças, sejam pessoas idosas.
Por essa razão, as medidas de conciliação não devem ser, apenas, pensadas para as mulheres, mas também direcionadas para os homens, que devem assumir, com efetiva partilha, as tarefas domésticas e de cuidado familiar.
O reforço dos direitos dos pais e o incentivo para que partilhem com a mãe a licença parental inicial são medidas que, de forma concreta, a promovem a igualdade entre homens e mulheres na conciliação da vida profissional e familiar e que, necessariamente, terão um forte impacto ao longo da vida, mantendo-se a partilha do cuidado familiar como prática constante e natural e não uma quase “obrigação” ou “tarefa” da mulher.
O objetivo é possibilitar, por um lado, o acesso dos homens ao âmbito doméstico cuidando dos filhos ou de pessoas mais velhas a cargo, e por outro, garantir que a mulher mantenha o seu emprego e que, ao mesmo tempo, o nascimento do filho ou necessidade de cuidar de uma pessoa não prejudique, exclusivamente a sua carreira.
Sendo certo que atualmente assistimos a alguma evolução na forma como as tarefas domésticas e de cuidado são repartidas entre mulheres e homens, continua, no entanto, a verificar-se que as mulheres dedicam mais tempo que os homens à realização de tarefas domésticas e de cuidado familiar (em média mais 1h45m).
Na verdade, o equilíbrio do tempo despendido por mulheres e homens na realização de tarefas domésticas e de cuidado, diminuindo assim a sobrecarga que incide sobre a mulheres, bem como a gestão equilibrada do tempo de uma forma geral, é fundamental para uma melhor conciliação entre vida profissional, pessoal e familiar, o que terá um impacto positivo e de melhoria nas perspetivas demográficas do país, constituindo não só um forte incentivo à natalidade mas, também, o caminho certo para alcançar uma efetiva, verdadeira e consistente igualdade entre mulheres e homens, com especial impacto mo mercado de trabalho.
E quando os filhos crescem? Será que os problemas com a conciliação desaparecem com o crescimento dos filhos e, sobretudo, com a chegada da sua idade adulta? Infelizmente não.
À semelhança do que acontece com a parentalidade, verifica-se também a necessidade de assegurar e garantir a proteção das pessoas cuidadoras com os mesmo mecanismos de proteção da parentalidade, alargando as medidas de conciliação entre a vida profissional e familiar a todas as pessoas que, podendo ter filhos já crescidos, têm familiares ou pessoas a cargo, que necessitam de cuidados. E a lei portuguesa já o permite.
A Igualdade de tratamento e de oportunidades entre mulheres e homens, constitui um imperativo de progresso social e económico sendo, igualmente, pressuposto fundamental para atingir os objetivos do desenvolvimento sustentável que a ONU definiu até 2030, de modo a que, no futuro, possamos ter uma sociedade mais justa, digna, decente, e com mais igualdade.
E esse deve ser o caminho a fazer, e é obrigação de todas as pessoas contribuir para esta mudança.
Carla Tavares, Presidente da CITE (Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego)

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