Opinião
Ver a última cimeira da NATO recordou-me novelas da Netflix, muitos atores, excelentes cenários, com um final feliz de que mais importante que um Estado social, necessitamos um estado armado até aos dentes para ajudar nas guerras que o nosso “Daddy” quer participar. Sem que se entenda um racional evidente, a Europa embarca na política de rearmamento à boleia de uma perceção de domínio e chantagem norte-americana que devia fazer corar de vergonha os líderes europeus. Definitivamente, a Cimeira da NATO apontou um caminho comum de união entre os membros, fingindo que se rearma em nome da “saúde da sua defesa” quando, na realidade, prega estacas de destruição no Estado social europeu que construiu a pulso durante décadas. Portugal vai reforçar em quase mil milhões de euros o investimento direto em aquisições de equipamentos, infraestruturas e valorização dos recursos humanos na Defesa até ao final deste ano (2% do PIB em Defesa já em 2025), num investimento total que suportaria muitos meses de custos do SNS. E assim se entendem as prioridades. Que os EUA querem desmantelar o Estado social europeu, não admira. Mas, à exceção de Espanha, que o faça com a concordância acéfala da União Europeia é de um requinte que ilumina a vergonha alheia. A mensagem de Mark Rutte, tristemente revelada por Donald Trump no seu estilo de indiferença perante o que deveria ser privado, talvez aconselhe outros políticos a maior recato na exposição das suas fraquezas e pequenez. É assim que o secretário-geral da NATO entra para a História como o grande bajulador saciado pelos feitos do seu “daddy”. A Europa vai pagar em grande, como devia, e será uma vitória tua”, lia-se na mensagem do neerlandês, que sempre defendeu o contrário quando era líder do seu país. A mensagem desfeita em elogios sabujos sobre o ataque ao Irão e sobre o aumento da despesa militar na Europa. Mark Rutte devia saber, enquanto pateta alegre diplomático que, ao nível da psicologia barata, Trump ganha sempre por goleada. Resta a consolação de pouco disto ser para valer. Ao longo dos próximos quatro anos, Portugal investirá acima dos 2% do PIB, de forma gradual e crescente, para em 2029 estar em posição de cumprir o objetivo final de 5% nos seis anos seguintes. Isto, sem metas anuais impositivas, sem tetos fixos, com o horizonte temporal de 2035 para chegar aos 5%, com a possibilidade de “revisão estratégica” em 2029. Ou seja, só o imediato é para levar a sério, já que em 2029 estaremos – provavelmente – com uma nova administração norte-americana e todo um novo mundo que não se adivinha. Para a Europa, este é só um começo para várias decapitações.
Joaquim Plácido
