ECO DA SANTA CASA

O cravo que não cheirei

two red carnation flowers with ribbon on black background, funeral concept

Tem a palavra a Mesa

Nem sei se me sinto apenas orgulhosa no tempo em que nasci, se me sinto aterrada com a ignorância do que não sei sobre os que viviam antes de mim.
Nasci em 1973. Não sei o que é não poder falar, não poder opinar ou recear pelas minhas palavras. Não imagino não poder votar nem discordar do rumo que outros traçam ou desejam traçar. Sempre me senti LIVRE. Sempre fui Abril.
Os livros que me foram dados a ler, retratam um país cinzento, rígido e mono focado. Os relatos dos mais velhos do que eu, contam episódios que parecem distantes e saídos de enciclopédias empoeiradas. Contam que o país que me viu nascer, se pautava pelo medo, pela censura. Olhando para a história, esta realidade parece ter sido ontem, mas eu sinto-a como algo tão tenebroso que parece a história do bicho papão, apenas contadas às crianças, mas que não passa de ilusão.
Sempre votei. Sempre me foi dada a hipótese de me expressar e, algumas vezes, ser diferente do outro. A democracia pinta-se às cores, tem por missão o respeito pela individualidade e o acesso de todos à informação e direitos legalmente definidos.
2024 celebra 50 anos do que terá sido o mais importante que este país assistiu. A 25 de abril de 1974, sem que eu pudesse ter consciência de tal, foi-me dado o maior dos presentes.
Porque somos ainda cegos? Porque continuamos a nascer antes de Abril? Porque queremos falar sobre tudo, sem censura, mas atacando os que são diferentes da norma. Quem faz a norma? Quem são os bons da fita? Quem tem direito a etiquetar o outro e colocá-lo em prateleiras categorizadas?
Tempo este difícil de compreender. Poucos anos de história nos bastaram para passarmos de orgulhosos dos direitos a capatazes da ingratidão. Esquecemos quem fomos e de onde viemos. Esquecemos que também estivemos fora e que, para sermos livres hoje, alguns estiveram presos e agrilhoados na sua condição. Quantas palmatórias se apanharam porque não se calaram as opiniões ou simplesmente porque não se cantou o hino.
Com o passar dos tempos temos conseguido durar cada vez mais anos, mas tenho que concluir que, duramos mais, mas não somos mais inteligentes. Parece que desvalorizamos o que outros conseguiram para nós. Valorizamos os arruaceiros, os que falam grosso e apresentam queijo para que possamos cair nas suas ratoeiras demagógicas.
Tempos difíceis estes em que os cravos só servem para a lapela. Por tudo quanto posso ler e falar. Pelo respeito aos que saíram à rua por mim. Por hoje poder escrever estas palavras…Viva o 25 Abril. Quem me dera que todos fossemos hoje militares de abril.


Teresa Gaspar
Mesária

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