OPINIÃO

A partícula elementar

Ouve lá Anamarte, já viste que nós em 2522 olhamos para as pessoas do ano 2022 como elas devem ter olhado para as pessoas de 1500 e estas as do ano 1000?
Acredito, Carlossildois, e na passagem do primeiro milénio deve ter sido difícil imaginar como foi no ano 500 e ainda mais na determinação do zero.
É isso, já viste que nesse momento é como se se tivesse inaugurado o sistema binário. Entre o 0 e o 1 mudou tudo.
Muda tudo e não muda nada. No ano 2022 nem percebiam bem como é que só há cerca de 500 anos a terra se tornara redonda e a navegação pelas estrelas iluminava o rumo nos mares e nós agora procuramos os mares por estes planetas todos.
Sim, é estranho, como é que demorámos tantos milhares de anos a aprender com os pássaros a libertar-nos do chão e esses nossos antepassados de 2022, por exemplo, nem poderiam imaginar como nos livrámos de tantas doenças, como nos alimentamos do ar, de que material nos revestimos, de que maneira deixámos de precisar daquilo a que chamavam casas e de que forma expandimos a memória e a capacidade de conhecimento. Que graça, eles nunca imaginariam porque não se pode imaginar o inimaginável…
Eh, eh, eh, tão estranho como eram assim limitados e já se deveriam sentir o pináculo da criação, ò Carlossildois. Como teriam evitado tantas consumições e sofrimento se relativizassem as coisas e se focassem no realmente importante. Bom, mas daqui a 500 anos dirão o mesmo de nós.
E desta tola obsessão pelo Xtran e pela Clonância.
Mas, como dizíamos há pouco, isto muda tudo, mudaram todas as respostas às necessidades, mas não muda nada, porque as perguntas se mantêm.
Deu-te para filosofar, o que estás para aí a dizer?
Estava apenas a pensar que continuamos a procurar saber o que estamos a fazer aqui e o que buscamos realmente. Quero dizer, no meio de toda esta tecnologia e do universo que vamos alargando, continua a fazer sentido olhar para aquele bebé que nasceu em Belém e condicionou todo o nosso entendimento.
Estou a ver o que estás a dizer e percebo-te bem. Dezembro continua a ser um mês tão especial. E dizes condicionou, mas o que mais o valoriza é a plena liberdade a que apela. A liberdade de viver, a liberdade de assumir os riscos de uma vida que, em qualquer época, é uma peregrinação.
Isso, por isso olhamos para o passado com tanta perplexidade pelo inesperado caminho percorrido, mas temos a certeza que o que nos une é essa centelha de fraternidade e de plenitude. Agora chamamos-lhe partícula elementar, mas acho que é o mesmo que os reis magos seguiram há 2522 anos. Esta é a força inesgotável e permanente do Natal.

Óscar Gaspar
Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Santa Casa da Misericórdia de Vagos

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