Opinião
Mais um ano e uma nova oportunidade para nos encontrarmos com Cristo que vem humildemente ao nosso encontro para nos transformar e dar a vida. Num tempo marcado pelo consumismo e pela “felicidade” a prazo, o verdadeiro sentido do Natal tem vindo a desaparecer ou a desvirtuar-se por completo. Se para uns se perde na vertente comercial, para outros resume-se apenas a um encontro ou a um jantar de família sem qualquer nota ou fundo espiritual. Neste contexto, já não há lugar para a oração nem para a participação nos sacramentos. Inebriados na superficialidade estética dos enfeites de Natal, poucos têm a ousadia de aprofundar e viver o seu real sentido.
Nesta quadra, elementos fundamentais como penitência e conversão; ou incarnação, redenção e salvação das almas já não são considerados e meditados pela grande maioria da sociedade. São palavras de vida eterna que, lamentavelmente, perderam espaço na linguagem imediata do tempo. Trocamos o eterno pelo passageiro, e porque aqui não se encontra a verdadeira felicidade, temos sempre aquela sensação interna de que nos falta algo. Por muitos bens que tenhamos ou por maravilhosa que seja a nossa família e amigos, por si mesmos, nunca nos poderão preencher plenamente. Isto acontece porque não são Deus nem são eternos, logo, são imperfeitos e insatisfatórios. É preciso entender que a nossa alma, criada por Deus, tem um desejo profundo de se unir a Ele e enquanto não O encontrar permanecerá sempre insatisfeita e agitada. Para responder àquele anseio, temos agora uma excelente oportunidade.
Antes da celebração do Natal, existe um período que prepara de modo especial a vinda de Jesus à nossa alma: é o Advento. Este é um tempo de penitência esperançosa caraterizado pelo jejum, pela abstinência, pela revisão de vida, pela oração mais intensa e pela caridade fraterna. No fundo, é um tempo de arrumar a casa para receber dignamente o Senhor Jesus que vem. É por esta nota penitencial que os sacerdotes se revestem de paramentos roxos neste tempo, tal como acontece na Quaresma. Conscientemente ou não, o resquício desta penitência própria do Advento encontra-se, ainda, presente nos nossos costumes. Por exemplo, o hábito de comer bacalhau na ceia de Natal, advém da tradição católica de abster-se de carne na véspera.
Mas, importa dar vida e sentido a tudo isto que falamos. Estimado leitor, não sei em que ponto da caminhada estará, se a sua vida espiritual está nutrida por Cristo e pelos sacramentos divinos ou se, pelo contrário, tem andado distante do Seu amor. Uma coisa tenho a certeza: está a tempo de regressar e este é o tempo oportuno! Ainda é Natal e não pode ser só mais um Natal. Deus espera-o e espera-nos para regressarmos ao seio do Seu amor.
Para começar uma nova vida precisamos, então, de iniciar um processo de conversão. Mas, como? Por onde começar? Importa, de modo humilde e sincero, fazer um profundo exame de consciência à luz de cada um dos dez Mandamentos da Lei de Deus, que no fundo são dez conselhos do Pai para a segurança, felicidade e santidade dos seus filhos amados. Feita esta revisão de vida, de coração arrependido, aproximar-se de um sacerdote e confessar humildemente os seus pecados, confiando na misericórdia infinita de Deus.
De facto, para renovar a alma importa dar este passo com franqueza e honestidade. É o próprio Jesus que o diz: «aqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados» (Jo 20,23). Não basta, por isso, confessar-se diretamente a Deus, mas precisamos da assistência da Igreja e dos seus ministros. Absolvido o pecado, purificada e animada a alma por um propósito sincero de conversão, é necessário depois nutri-la com o próprio Cristo que se dá todo e por inteiro no sacramento da Eucaristia. Ele, conhecendo a fragilidade da nossa condição humana, faz-se alimento para a jornada da vida cuja meta é o Céu. Partindo desta base, enxertados em Cristo, brota assim a vida da graça, da oração e da caridade fraterna que, de entre tantos modos, se torna particularmente visível em instituições como a Santa Casa da Misericórdia cuja a identidade e missão é servir!
Luís Ramos Rodrigues
Seminário Maior do Porto
