OPINIÃO

Sobre a inauguração do Palácio da Justiça de Vagos

Cantinho de João Ferreira
O único Primeiro-Ministro do tempo de Salazar à parte do mesmo, ficou conhecido em Vagos por inaugurar o Palácio da Justiça, um ano antes da sua forma de governar ser derrubada. Ao seu lado estava o ministro da justiça da época, Doutor nascido na aldeia do Boco: Mário Júlio de Almeida e Costa (que morreu no dia seis do mês de agosto de 2025). Estávamos em 1973 e nada mais se passava em Vagos, terra que na altura era bem pacata.
Tenho a celebrar a presença dos Bombeiros Voluntários de Vagos, à altura liderados pelo comandante Miguel Sarabando, que no livro de Armor Pires Mota, aos mesmo dedicado, aparece em foto na página 153 a saudar o Primeiro-Ministro dos tempos da presidência de Américo Tomás. Da Banda Filarmónica de Soza estavam os fundadores, Senhores António Vieira e Cipriano Vida; do Clube de Columbofilia de Soza não recordo ninguém em particular , mas lembro que fizeram uma largada de pombos em forma de homenagem e comemoração; o Eco de Vagos, caso esteja o leitor a indagar, tinha visto a distribuição da sua primeira edição parada em 1934.
O Eco estava parado há 39 anos devido a este senhor Primeiro-Ministro bem como o seu antecessor e a Presidência da República, e todos esses altos cargos políticos do Portugal Fascista. Mal sabia o senhor Primeiro Ministro Marcelo Caetano, ao qual agradecemos o corrente Palácio da Justiça de Vagos, que não tardaria a ser interpelado, pelas forças armadas portuguesas. À cabeça António de Spínola, do outro lado do “cravo” Marcelo Caetano, ali deposto. Do que sei, o segundo fugiu do arco democrático português para vir a morrer no Brasil. O primeiro ao revés, liderou Portugal como 14º Presidente da República Portuguesa sendo alguns meses depois sucedido por Francisco da Costa Gomes.
Assim, morta a “Outra Senhora”, Vagos voltou a ecoar a partir de 20 de Agosto de 1974, mas sem rei nem roque. Nova a república, sobravam memórias vivas do passado, uma delas, o hoje já quase extinto analfabetismo. Sabendo escrever, fui convidado a redigir um ou mais artigos neste pequeno periódico, hoje mais que centenário. Este jornal que tanto enriqueceu a minha vida, e, gosto que crer, que a de tantos mais: Eco de Vagos.
Os que me chamaram para escrever eram adeptos do Partido Comunista Portugês, e quem os liderava dizia: ”nem se regista que agora vale tudo”. Desta forma, os primeiros meses desta segunda edição começaram com algum atraso e à boa maneira pirata. Tendo havido desavenças entre os vários jornalistas, certo dia, deixaram todos os documentos pertencentes ao periódico na porta da minha casa em Soza.
Sem saber melhor, mantive o jornal à margem da lei durante uns dois anos, isto até receber uma carta do Palácio Foz a explicar que todos os jornais tinham que ser registados. Desloquei-me à Gafanha da Nazaré, para falar com um outro Diretor de Jornal que pouco me soube explicar também. Costuma dizer-se que “por vezes saímos às compras, tendo o remédio em casa”: a carta, já lida pelo meu filho, explicava onde tinha que ir, o que tinha de fazer e os documentos dos quais devia estar em posse. Fui conduzido por um já falecido amigo a Lisboa, Sr. Mário Martins Rei, sendo que na capital passei por um escritório no Campo Pequeno, para me dizerem que o jornal nunca tinha sido registado. Daí fui aos restauradores ao Palácio Foz para registar o jornal a meu nome.
Voltando a Vagos, havia o diz que disse: “Como é que o João pode ser dono de um jornal sendo tão pobre?”, quando me perguntavam, respondia jocosamente: “Como fui eu a registar, pus em meu nome”. Ali, mesmo sem que eu soubesse, começavam quase quarenta anos de árduo trabalho: metade da minha vida, que só estancou a par com a doença da outra metade: Maria Lina Ferreira Costa dos Santos, mulher que me acompanhou até há dez anos atrás.
A foto, bem se nota que é da frente do Palácio da Justiça, e, tendo fugido ao tema, mais haverá a falar na próxima edição. Até lá, um voto de boas leituras.

João dos Santos Ferreira

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